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Superior impede penhora de imóvel de família

TST reformou decisão que veio do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região permitindo que a casa de executivo com dívida trabalhista fosse executada para garantir o pagamento do débito

São Paulo – O Tribunal Superior do Trabalho (TST) reforçou o entendimento de que o imóvel de família é impenhorável mesmo quando for “suntuoso” e o dono estiver comprometido com uma dívida trabalhista alta.

De acordo com o especialista da Saito Associados, Guilherme Raymundo, a decisão solidifica a jurisprudência e garante que os juízes não podem mudar aquilo que está escrito na lei. “Aqui no Brasil, a impenhorabilidade do bem de família foi regulada na Lei 8.009/1990”, explica.

Raymundo comenta que o tribunal paranaense em que o processo foi originado se baseou na hipossuficiência do funcionário e na necessidade de serem pagas as verbas trabalhistas para que ele pudesse manter sua subsistência. “A decisão do Paraná declarou que as verbas trabalhistas têm caráter alimentar, mas esses argumentos não mudam o que está na lei”, afirma o advogado.

No caso, um empregado entrou na Justiça para reaver verbas trabalhistas não pagas pelo empregador. Na primeira instância, foi permitida a penhora do imóvel em que o sócio residia com a família para garantir o pagamento do débito. O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9), que opera no estado do Paraná, manteve a decisão.

Apesar de a casa ser reconhecidamente um bem de família, a relatora, juíza Eneida Cornel, entendeu que por se tratar de um imóvel de 5.470 m² e avaliado em R$ 13,5 milhões, o dono poderia facilmente adquirir outro após saldar a dívida. “Compreende este relator, portanto, que, neste caso específico, não pode prevalecer a proteção do bem de família suntuoso em detrimento do crédito alimentar/trabalhista, pois o valor do imóvel é excessivo, podendo os executados adquirir outro imóvel com valor remanescente da hasta pública. Posto isso, reforma-se a referida sentença para manter a penhora sobre o imóvel”, aponta acórdão.

No TST, a decisão do TRT-9 foi reformada. O ministro relator do recurso, Aloysio Corrêa da Veiga, destacou que não é possível ignorar a garantia constitucional dada à propriedade privada familiar mesmo que o objetivo seja garantir as verbas alimentares de um trabalhador. “O fato de a residência da família referir-se a valor muito superior ao débito executado não é suficiente, per se, a flexibilizar a garantia constitucional, sob pena de impedir a segurança da sociedade, eis que a penhora da residência inibe a harmonia e o equilíbrio que deve reger a convivência familiar, bem maior a ser protegido, eis que retrata o interesse social comum”, expressou em seu voto.

Para Raymundo, a questão principal desse processo é uma disputa de prioridades entre a função social do trabalho e da propriedade. “O trabalhador tenta argumentar que a verba trabalhista tem caráter alimentar, com função social. No entanto, o bem de família é protegido pelos princípios constitucionais do direito à moradia e da proteção da propriedade privada”, afirma.

Raymundo pondera que apenas essa decisão não vai consolidar toda a jurisprudência em torno da impenhorabilidade, mas que é um precedente interessante. “Outras turmas também já seguiram esse entendimento. Mas não é nada definitivo, o Judiciário vai se consolidando com o passar do tempo”, opina o advogado.

Como alternativa à penhora da casa, o especialista da Saito Associados, diz que há dispositivos na lei que permitem a penhora de bens que estejam dentro do imóvel, tais como obras de arte.

O sócio do Fagundes Pagliaro Advogados, Leonardo Tonelo Gonçalves, avalia que a Justiça do Trabalho passou a enxergar que independente do valor do bem, a lei defende a impenhorabilidade. “É uma decisão melhor vinda de um tribunal superior. A proteção do funcionário não pode passar por cima da lei”, defende.

Incerteza

Gonçalves entende que a dúvida que ainda paira sobre o caso é a caracterização de bem de família na Justiça Trabalhista. O advogado lembra que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já editou uma súmula para tratar dos casos em que um imóvel alugado pode ser considerado de família, mas não existe essa previsão no direito do trabalho.

“O STJ diz na Súmula 486 que esse bem pode estar alugado desde que a pessoa dependa daquele aluguel para sobreviver. No trabalhista isso nunca foi discutido. Então, nesse ponto ainda existe insegurança”, conclui.

Ricardo Bomfim

Reportagem publicada no Jornal DCI

Guilherme Raymundo, advogado da Saito Associados, especialista em Direito Cível e Imobiliário, para o Jornal DCI – 30/08/2017